terça-feira, 22 de novembro de 2011

MARGARIDA MAX à La Garçonne, 1924

Em 1922, foi lançado na França o romance La garçonne, de Victor Margueritte. Embora sendo considerado um escândalo, várias edições foram esgotadas, sendo um sucesso mundial. Em 1923, foi lançado no Brasil com o título de A emancipada, trazendo como subtítulo o título original.
Logo, surgiram coisas o nome À la Garçonne ou À la homme, principalmente os cabelos femininos aparados na altura da nuca, que causavam escândalos.

Em Hollywood, estrelas como Pola Negri e Louise Brooks, ajudaram a divulgar a moda.

No Brasil, a pioneira desse estilo foi a atriz e soprano Margarida Max, uma das mais queridas Rainhas do Teatro de Revista, que reinou absoluta no início dos anos 20.
Como era regra, toda novidade de destaque era logo retratada no teatro de revista carioca.
Em 05 de maio de 1924 estreou, no Theatro Recreio, a peça À la garçonne, de Marques Porto e Afonso de Carvalho. A música ficou a cargo do excelente compositor Pedro de Sá Pereira.

Salvyano Cavalcanti de Paiva nos conta que a peça "apresentava uma urdidura moderna aproveitando assuntos da atualidade através de comentários ora amáveis, complacentes, ora mordazes, implacáveis, deliciando e fazendo rir à socapa ou abertamente". O sucesso foi absoluto. A crítica e o público, unânimes, adoraram o espetáculo que, em quatro meses, teve mais de 300 (trezentas!) representações ininterruptas, foi considerada a revista (peça) do ano e uma das 10 maiores de todos os tempos.

A direção ficou com Francisco Marzullo,a regência orquestral com Antônio Lago (pai do ator e compositor Mário Lago).
Coreografia - Gus Brown
Cenografia - Lazary, Públio Marroig, Raul de Castro e Marco Tullio
Figurinos - Alberto Lima
Elenco - Margarida Max, Ester Lutin, Luísa Fonseca, Diola Silva, Téo Dorá, Antonieta Fonseca, Isaura Pereira, Henrique Chaves, Francisco Correia, J. Figueiredo, Balbina Milano, Agostinho de Souza, José Loureiro, Orlando Nogueira, Pascoal Américo, Edmundo Maia, Domingos Terras, Claudionor Passos, Manoela Mateus, Júlia de Abreu, Maria Matos, Judith Vargas, Renée Bell, João Martins, Lídia Reis e Lola Giner.

Para a peça, Margarida Max e as coristas foram submetidas às tesouras implacáveis e seus cabeleireiros, por ordem da produção. De tesouras e máquina zero à mão, elas cantavam com estrondosa repercussão a música Cabeleira à la Garçone, da autoria de Pedro de Sá Pereira, com música de Américo F. Guimarães.

Salvyano Cavalcanti Paiva nos apresenta uma letra, cantada no teatro, diferente à que foi gravada.
Como a peça estreou em maio de 1924, Cabeleira à la Garçonne, na verdade um foxtrot, fez grande sucesso no carnaval de 1925. 
A grande soprano Zaíra de Oliveira gravou a música na Casa Edison, provavelmente, em 1924, sendo o disco lançado em 1925 para o carnaval.

Como se dizia na época, a peça abafou a banca!
Os espectadores saiam todas as noites do Recreio assobiando a melodia de Cabeleira à la Garçonne.
Muitas moças e senhoras, aderiram à nova moda, pondo abaixo as enormes madeixas que cultivavam, fazendo aparecerem bonitas nucas, que passariam a ser arejadas durante o verão carioca e, brasileiro.

Um detalhe importante!
Lembram das mais de 300 representações originais da peça?
Bom, em 14 de novembro daquele mesmo 1924, À la garçonne foi reapresentada e ficou em cartaz até o dia 05 de novembro, com, aproximadamente, 30 (trinta) representações.

A crítica declarou que a peça era "leve, engraçada, brejeira, sem quadros fatigantes". Era "urdida à moderna, aproveitando assuntos em foco através de comentários ora amáveis ora mordazes". Exaltava a classe de Margarida Max, a vivacidade de Manoela Mateus, "estrelíssima" graça à sua natural simpatia. Mencionava as interpretações positivas de João Martins, José Loureiro e Edmundo Maia nos quadros de crítica de costumes.

E não foi só isso...

Em 1955 (31 anos após a estréia da peça), na pré-estréia do show A Grande Revista*, a atriz Zaíra Cavalcanti, já veterana e em boa forma, cantou Cabeleira à la Garçonne. Foi uma emoção geral na platéia! Ainda mais, por um motivo: a própria Margarida Max, sua criadora, estava na platéia, como convidada especial. 

* Produção e direção de Carlos Machado, montada no night-club da Cinelândia chamado Night and Day, feita para a crítica teatral. 

Segundo Salvyano, que lá se encontrava, a apresentação provocou "lágrimas, risos e aplausos entusiásticos à ideia, a Machado, à criadora, a inexcedível Margarida Max, e à interpretação soberba de Zaíra". 
Com certeza, um evento inesquecível.

Pequena conclusão
Sempre considerei a década de 1920 a que mais rompeu tradições e quebrou tabus. Se olharmos como a mulher vivia, se vestia e era vista nas décadas anteriores, notaremos uma gritante diferença. Nessa década ousada, já não eram padrões os vestidos longos e já podíamos contemplar belas pernas; a ousadia das vamps colaborou para que mais vozes e pensamentos femininos fossem ouvidos, afinal, estava escancarado que a mulher também tinha desejos; um fato interessante dessa década é a inserção do violão, até então marginalizado, nas salas de famílias, sendo tocados por mocinhas, que tinham aulas com antigos violonistas ou por senhoritas que já haviam abraçado o instrumento. Agora, tocar violão era elegante e dava um tom intelectual às jovens.
Um dos fatos mais marcantes, sem dúvida, foi o corte estilo à la garçonne. Até o surgimento da moda, as mulheres traziam cabelos longuíssimos, usando-os em penteados ornamentais que, ainda por cima, ainda traziam apliques para um melhor acabamento. Ao vermos numa época vizinha a essa as mulheres com cabelos curtíssimos, com máquina zero à nuca, temos claramente o fim de uma época e início de uma outra que, até hoje, nos é mais próxima.

Confiram a música

Cabeleira à la Garçonne
Foxtrot de Pedro de Sá Pereira e Américo F. Guimarães
Gravado por Zaíra de Oliveira
Disco Odeon Record 122.768
Lançado em 1925



Cabeças à la Garçonne
Com toda graça repetis
As cabeleiras encantadoras
Da moda chique de Paris
A cabeleira é só perfume
A cabeleira, só assim
É um borrão de negrume
Com um borrão de carmim

Cabeleira à la Garçonne
Usá-la assim
Eis que é preciso
Cabeças que só tem cabelo
E mais cabelo que juízo

Com tão curtos os cabelos
A face fica, assim, mais linda
Nossa cabeça que é tão leve
Ah! Fica assim, melhor ainda
Não se pode mais dizer
Que a mulher, oh, que atrevidos
Tem as idéias muito curtas
E tem os cabelos compridos







Margarida Max com seu cabelo à la Garçonne.






Fontes:
Arquivo Nirez
Arquivo Marcelo Bonavides
Salvyano Cavalcanti de Paiva, Viva o Rebolado - Vida e morte do teatro de revista brasileiro, Nova Fronteira, 1991.

2 comentários:

  1. Olá, Bonavides

    É delicioso, vir aqui.Minha ma~e, não só cortava o cabelo à La Garçonne, como falava muito de Zezé Leone, que era "personagem" de uma canção que ela costumava cantar: "Zezé Leone, Zezé Leone, cortou o cabelo à La Garçone"...(é do que me lembro). Não dei se existiu essa "Zezé Leone" ou se era só para rimar rsrs...
    Essas suas postagens, são DIVINAS!

    P.S. > Quanto ao seu e-mail, creio que foi para o antigo da bol...esqueci a senha e não consigo acessá-lo.
    Meu mail atual é: lubpaiva@gmail.com

    Grande abraço,
    da Lúcia

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  2. Zezé Leone foi a primeira Miss Brasil, eleita em 1923, no RJ, aos 20 anos de idade. Nascida em Campinas SP, vivia em Santos.
    Congrats,
    Nica.

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