terça-feira, 30 de outubro de 2012

AutoBiografia de SYLVIO SALEMA GARÇÃO RIBEIRO

AutoBiografia de SYLVIO SALEMA GARÇÃO RIBEIRO
compilada por seu filho a partir do original manuscrito.


Nasceu no dia 30 de outubro de 1901, na cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro.

Seus pais foram o Dr. Francisco Salema Garção Ribeiro, médico, poeta e literato; foi considerado por Francisco de Castro o maior parteiro de sua época. Era humanitário e seus clientes pobres o denominavam “o médico dos pobres”, em São Cristóvão. Foi um dos auxiliares de Oswaldo Cruz na campanha da Peste bubônica e na Vacina Obrigatória. Era católico e chegou a ser Provedor Perpétuo da Igreja de São João e N. Sra. do Alívio, em São Cristóvão. Era descendente de D. Antonio Salema, 4º Governador das Capitanias do Sul, na época do Brasil Colônia, e do poeta Garção, um dos fundadores da Arcádia Portuguesa.

Sua mãe, D. Alda da Mota e Silva, era bisneta de um casal de índios da ilha de Marajó, cuja filha se casou com um português, que foi contador do Banco do Rio de Janeiro, além de poeta e cantor.

Até os seus 6 ou 7 anos era muito quieto, não fazia artes nem mal-criações. Ficava sempre observando os vestidos que a mamãe fazia para inúmeras freguesas. O garoto observava, sem maldade, e gostava de ver as rendas e os bordados das calças, saias brancas, corpetes, etc. ele se deleitava também com as músicas e procurava imitar seus avós e sua mãe, que possuíam lindas vozes, e mais, a uma mulata, Jovita, que cantava lindas canções. Salema procurava imita-los e, quando ia às procissões de Nossa Senhora do Rosário e São Benedito dos Homens Pretos, na Uruguaiana, cantava com o povo. O seu primeiro presente, que ele pediu ao seu pai, foi um gramofone pequenino, para carrega-lo para o porão, tocar os discos dos grandes cantores e cantar acompanhando-os.

Seus dois irmãos e um primo órfão eram tão levados que os pais não podiam deixar o Sylvio em casa e, em virtude de seu pai ser médico dos artistas, o Sylvio assistiu a representações teatrais desde os 4 anos. O garoto ficava emocionado, assistindo Nijinski, Brazão e outros artistas e espetáculos do teatro clássico e popular. Por duas vezes “abriu um berreiro” violento. O primeiro foi na cena do cemitério de Hamlet, quando Brazão segurou uma caveira e disse o celebre: “Ser ou não ser”. Sylvio Salema saiu do teatro apavorado, porque seu pai tinha uma caveira em casa. De outra feita foi quando assistia a um daqueles dramalhões em que o “Remorso Vivo” aparece no meio da mesa do banquete. Outra saída rápida do Salema por causa das “almas do outro mundo” e “Bicho-papão”.

Aos poucos ia entrando na “turma” porque podia acompanhar os seus irmãos. Principalmente com o gude, etc, até integrar definitivamente o bando de apanhar balão, pular muros, tocar campainhas, atacar a “Chacrinha”, terreno enorme, em São Januário, onde hoje é o campo do Vasco da Gama F. R., para apanhar jambo, goiaba, manga, sapoti, etc., sempre “brigando” com os cachorros que guardavam a chácara. Havia um plano de ataque: uns garotos enfezavam, “brigando” com os cachorros e os homens de um lado, enquanto que, do outro lado, outros garotos apanhavam os frutos e, algumas vezes umas pedradas e violentas corridas, mas, “eram cavacos do ofício”.

Sylvio Salema Garção Ribeiro fez seu curso primário no Colégio Santa Cecília, onde estudou teoria musical, solfejo e inicio de piano com a professora Maria Paulina Bivar, chamada de Dona Biloca, e com o Padre Giuseppe Fonti impostação de voz e canto. Após a morte de D. Biloca, Salema passou a estudar com D. Belinha, sobrinha de D. Biloca. Aí é que começou a estória do desenvolvimento do menino que ia fazer a 1ª comunhão, e tem de se portar bem para não pecar e tirar o retrato todo de branco, com velinha e lacinho de fita, etc. O Salema formou com os outros esperando a condução. Ela estava demorando... Vai daí, um empurrão, e ele caiu completamente dentro de um buraco, cheio de lama, na calçada. Naquele tempo já havia buracos. Na hora do retrato, o único que estava de terno escuro era o Salema. Fez concurso para o Colégio Pedro II, tendo cursado até o terceiro ano quando se transferiu para a Escola Normal,terminando o curso de professor primário em 1924.

Teve também sua fase esportiva, como todos os garotos, sendo que chegou a ser vice-campeão pelo Palmeiras F. C., da Quinta da Boa Vista. No dia do jogo que iria decidir o campeonato o Sylvio Salema, que tinha 13 anos incompletos, não pôde fazer a barba. Foi uma discução terrível e o Juiz parecia uma fera, quando o Salema disse: “O Sr. pode escrever na súmula que eu estou barbado, mas tenho 13 anos incompletos, mas declaro que o Nogueira, que não tem barba, podia ser meu avô”. O jogo foi realizado e o Salema ficou sendo Vice-Campeão Infantil... Barbado...

Fez parte, aos 9 anos, do coro Santa Cecília da igreja de Sant’Ana, sob a direção do Cônego Alfeu Araújo, que lhe pagava 10$000 (dez mil réis). No dia da missa, ele dava um cálice de vinho aos cantores adultos e para os meninos, doces finos. É claro que o Salema, um dia, distraidamente, comeu todos os doces.

Salema lutou sempre e muito para vencer na vida, cantando todos os gêneros de música, da sacra, em quase todos os templos do Rio, no Coral Pio X, sob a direção do Maestro Ricardo Galli, onde foi 1º tenor até 1954, durante 33 anos. Em 1922, entrou para os Correios e Telégrafos, por concurso como praticante, ao mesmo tempo em que cursava a Escola Normal e a Escola de Canto do Teatro Municipal, tendo prestado exame final, onde foi aluno de Borgongino, Silvio Piergile e Mario Sammarco. Durante as temporadas líricas, os alunos eram obrigados a fazer pratica de cena. Dentre muitas gafes, uma delas foi importante porque ele entrou em cena vestido de caçador, tendo, além de enorme chapéu, botas, espingarda que não tinha mais tamanho e uma espada, que pouco faltava parecer maior do que ele. Do cenário figurava um castelo de onde os caçadores saiam; neste momento deu-se o inesperado: a espada prendeu-se ao cenário e o castelo andou puxado pelo Salema. O público iniciou uma gargalhada, mas, a espada caiu e o cenário voltou ao seu lugar.

Nomeado em 1927 como professor primário, trabalhou nas escolas da Penha, Escola Estados Unidos e de Santa Cruz, e na comissão de música do Instituto João Alfredo.

Durante o tempo em que esteve na Escola Estados Unidos, ensaiou 800 alunos para cantarem o Hino Norte-Americano, em inglês, na inauguração da estátua da Amizade, oferecida por aquele país ao Brasil.

Por designação do Diretor de Instrução Fernando de Azevedo, em 1929, fez parte da comissão de organização do 1º programa de música para as escolas primárias, secundárias e normalistas, programa esse que foi publicado em 1930 e continha o Orfeão Escolar e Folclore Nacional. A comissão era constituída pelo Maestro Francisco Braga, Eulina de Nazareth e Sylvio Salema. O importante é que Salema era um modesto Adjunto de 3ª classe. Este acontecimento lhe proporcionou (1930) a ser pioneiro do ensino de Canto Orfeônico (antes de Villa-Lobos – 1932) e também, do ensino oficial do Folclore Nacional.

Em 1923, começou a cantar na Rádio Sociedade do Rio de Janeiro músicas de câmara e ópera, tendo iniciado programas de música brasileira. Organizou um grupo de cantores e conseguiu irradiar as seguintes operetas completas: Eva, Duquesa do Bal Tabarin, Rainha das Rosas, Amor de Príncipe, Flor de Sevilha e na Rádio Mayrink Veiga, a Viúva Alegre, Princesa das Czardas, Eva e Conde de Luxemburgo. Até 1930, cantou no Rádio Clube do Brasil, na Rádio Educadora do Brasil, na Rádio Jornal do Brasil, Tupi, Nacional, Ipanema e Philips.

Escreveu para radio uma novela que foi levada pela Radio Educadora, concorreu ao concurso de Radio Sherlok, sendo premiado na Mayrink Veiga.

Organizou e dirigiu o Programa Case e o Programa Único.

Foi radio ator do “cast” do Radio Clube do Brasil, sendo Diretor, Renato Murce e na Radio Cruzeiro, com Paulo Roberto. Com a criação da Superintendência de Educação Musical e Artística, em 1932, Sylvio Salema foi designado Assistente Técnico do Maestro Heitor Villa-Lobos, a quem já conhecia desde 1910, tendo auxiliado graciosamente, como cantor em 1917 e 1918, cantando concertos e participando da 1ª apresentação da ópera Izath (3º e 4º atos).

Em 1935 fez o curso de Orientador Especializado, curso esse que fazia parte da Universidade do Distrito Federal e era ministrado no Instituto de Educação. Os professores que terminaram o curso de Orientador passaram a Técnicos de Educação. Foi professor de música e Canto Orfeônico, em 1934, da Escola de Educação Física do Exército e neste mesmo ano organizou o Orfeão da tripulação do encouraçado São Paulo e cruzador Bahia, constituído por 1500 marinheiros.

Organizou os orfeões das bandas de música da 7ª Região Militar, com sede em Pernambuco, ensinou hinos e canções aos soldados das fortalezas de Costa Leme, São João, Laje, Vilegaignon, Rio Branco e Copacabana.

Organizou o orfeão da Fábrica de Armas, de Itajubá e da Fábrica de Estojos, de Benfica, ambas no estado de Minas Gerais. Criou e orientou o ensino de música e Canto Orfeônico nas escolas primárias de Juiz de Fora/MG.

Foi membro da Comissão do livro didático da Secretaria Geral de Educação.

Realizou palestras culturais através da Rádio Roquette Pinto, com quem trabalhou, tendo sido o primeiro locutor dessa estação (PRD5). Na música popular, Salema já vinha gravando discos desde 1918, e depois, de 1927 até 1930, quando interpretou valsas, modinhas, marchas e sambas, como artista exclusivo das marcas: Victor, Parlofon e Odeon, tendo alcançado sucesso com “Morena cor de canela”, “Voz solitária”, “Alma de Boêmio”, e a inesquecível “Valsa do meu amor”.

Em 1935, Salema gravou um disco especial para a feira Internacional de New York, como solista, sendo a música “Jaquibau”, de Villa-Lobos, sob a regência e direção do próprio autor, e o coro orfeônico de 200 vozes do Orfeão dos Professores.

Participou, em 1936, como solista dos Concertos Culturais promovidos pela Secretaria Geral de Educação no Teatro Municipal, sendo interprete na apresentação do Oratório Judas Macabeus, de Haendel, em virtude do qual seu nome está consignado na Academia de Música de Berlim, Alemanha e também, na Inglaterra, isso porque, os ingleses consideram que Haendel é Inglês e os alemães, que é Alemão. Dessa briga quem ganhou foi o Salema.

De 1932 a 1943 foi assistente do Maestro Villa-Lobos e, com a nomeação deste para o Ministério da Educação como Diretor do Conservatório de Canto Orfeônico, Salema foi nomeado Chefe do Serviço de Educação Musical e Artística (SEMA) em 1943, onde permaneceu, neste cargo, durante 12 anos, tendo criado, além do Canto Orfeônico deixado por seu antecessor, Salema iniciou o ensino instrumental nas escolas primárias externas, surgindo desse ensino 4 bandas de música; até então só existiam bandas de música nas escolas secundárias internas.

Autor dos programas de música e Canto Orfeônico para as escolas primárias e normalistas, em 1945. Criou o ensino de iniciação musical e bandas rítmicas, nos jardins de infância, ensino instrumental (piano e violino) e cursos de “ballet” nas escolas primárias. Sylvio Salema é um dos poucos músicos relacionados no livro: “Quem é quem?”, publicação oficial do Ministério do Exterior e distribuído pelas embaixadas brasileiras do exterior. Foi distinguido pelo governo do Estado de Minas Gerais com a Medalha e Diploma da Inconfidência, por serviços prestados. Foi membro da Comissão Nacional de Música do IBECC.

Obras corais aprovadas pela Secretaria Geral de Educação e Cultura:
Hino a Rio Branco (Oficializado pelo Ministério do Exterior)
O Contrabaixo
Hino à Redentora
Meu sapinho
Acalentando
Leonor
Mãe Maria
Desafio
Cateretê
Tão doce luz
Onde eu nasci
Soldadinhos
Retumba
Bango-zi-balango
Gloria a Jesus
Panis Angelicus
Ave Maria (para canto e harmônio)


Participou como representante da Secretaria Geral de Educação do 1º Congresso Nacional de Folclore, no Rio, tendo apresentado um trabalho de pesquisa: “Canjerê”, sendo esse trabalho aprovado unanimemente e o plenário resolveu que devia ser incluído nos anais do Congresso o mesmo acontecendo no 2º Congresso Nacional, realizado em Curitiba/PR, sendo também aprovado e mandado publicar pelo plenário o seu trabalho: “Origem do Samba”. 

No Congresso Internacional do Folclore, realizado durante o IV Centenário de São Paulo, defendeu, na comissão do International Folk Music Council, a diferenciação entre a música popular e a folclórica, sendo aprovada a proposição brasileira. Durante as comemorações do IV Centenário de São Paulo, fez parte da comitiva carioca dos artistas populares da Velha Guarda, tendo cantado, com sucesso “Olhos de Veludo”, em um teatro de São Paulo, acompanhado por flauta, cavaquinho, violões e saxofone (Pixinguinha, Bidi, Donga, etc). 

Realizou-se, também, em São Paulo o 1º Congresso da Juventude Musical Brasileira, tendo Sylvio Salema, que representar a Prefeitura do Distrito Federal, tendo apresentado o “Orfeão Villa-Lobos”, da Escola Normal Carmela Dutra e o “Orfeão Ernesto Nazareth”, da Escola Secundária Princesa Isabel, o primeiro, sob a direção da professora Nilza Gama e o segundo, dirigido pela professora Ivette Coelho da Cunha. 

Apresentou também uma palestra: “O papel da música na educação do jovem”, que foi aprovada e mandada publicar nos anais, recebendo os maiores elogios de Marcel Cuvelier e Luiz Heitor Corrêa de Azevedo, ambos da UNESCO. Foi designado para a Comissão do 2º Congresso da Língua Falada e Cantada. Fez parte da Comissão Artística da Rádio Roquette Pinto. 

Fez parte da Comissão do Livro Didático, da Secretaria Geral de Educação, da P.D.F. Criou, no Serviço de Educação Musical e Artística, em 1943, a Comissão Consultiva Musical e o Orfeão dos Professores da Prefeitura do Distrito Federal, o qual dirigiu durante mais de 10 anos. 

Em 1948, criou a “Semana da Música”. Em 1950, conseguiu a promulgação da Lei 523, que criou os quadros de Técnicos e professores especializados em música e Canto Orfeônico. 

Em 1952 (lei 703, de  5 de junho de 1952) conseguiu a criação da Escola Popular de Educação Musical e Artística (EPEMA), atual Instituto Villa-Lobos, que hoje se denomina UNIRIO, situada na Praia Vermelha – Urca. 

Dirigiu inúmeras demonstrações de Canto Orfeônico. No Campo do Vasco da Gama (15.000 vozes), Fluminense (8.000 vozes), Botafogo (12.000 vozes), na Esplanada do Castelo (41.000 vozes), no Campo do Russel (18.000 vozes), no Campo de Santana (Congresso Catequético, com 12.000 vozes); Congresso Inter-Americano de Higiene (Teatro João Caetano), Congresso Catequético (Teatro Municipal), Congresso Inter-Americano de Educação Física (Campo do Fluminense); Campeonatos: Infantil e Juvenil, promovidos pelo Jornal dos Esportes (Campo do Fluminense e do Vasco da Gama). 

Foi Presidente do Conjunto Orquestral Francisco Braga, do Conjunto Vocal “Vozes do Brasil”, da Orquestra de Câmara do Rio de Janeiro. 

Autor de um livro de poesias: “Poemas de Luz e Sombras” e de um outro sob o título “Um Bárbaro e Cruel da História do Brasil”, que mereceu crítica, louvável não só no Brasil, como também em Portugal. 

Foi sócio efetivo do Instituto de Colonização Nacional. Foi critico musical dos jornais “O Imparcial”, “A Notícia” e “Democracia”. Teve várias de suas letras musicadas por: Villa-Lobos,Homero Dornelas, José Francisco de Freitas, Aldo Taranto, Cacilda Borges Barbosa, Lucilia Guimarães Villa-Lobos e Maria Dulce Antunes.



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